Há tradições que passam entre gerações. Podem ser brincadeiras, superstições familiares ou encontros na mesma data todos os anos. No caso da família de Carlos Ferreira, a tradição está ligada ao comércio. A bisavó tinha uma mercearia no centro da cidade, a Pomar Sra-a-Branca, que entretanto passou para os filhos, e anos mais tarde ficou para os pais de Carlos. O espaço é conhecido pelo facto de os produtos exclusivos virem das redondezas de Braga, com especial destaque para os enchidos, legumes, azeite e garrafeira.
Contudo, a ambição de manter viva a essência do comércio tradicional na cidade minhota levou a família a investir numa série de negócios históricos que estavam em risco de serem fechados. A conquista começou há oito anos, quando se tornaram proprietários de A Favorita, um dos mais antigos cafés de Braga. O espaço, fundado há 90 anos, mantém a traça característica das décadas de 60 e 70 e tem uma das melhores esplanadas do concelho.
Seguiu-se a famosa pastelaria com serviço à mesa Frigideiras da Sé. Dois anos mais tarde, tomaram conta da pastelaria e confeitaria gourmet Rosil, com mais de 50 anos de história, e ainda da Doçaria São Vicente, com quase 200 anos de confeção de doces conventuais. Em janeiro do ano passado, a família Ferreira assumiu a gerência da Adega Malhoa, restaurante tradicional português com pouco mais de duas décadas.
“Até há uns anos dizia-se que Braga era a cidade com mais restaurantes por mil habitantes no País. Nos últimos anos, os meus colegas da restauração têm investido em conceitos mais modernos, mais conceituados, e consideramos que a comida de panela começa a perder a sua singularidade. Na Adega Malhoa vimos a oportunidade de resgatar o receituário tradicional minhoto, e servir os pratos mais antigos nos dias de hoje”, começa por contar o jovem de 40 anos à New in Braga.

E acrescenta: “O nosso principal foco é servirmos pratos de conforto de avó. Termos sempre as nossas papas de sarrabulho, arrozes caldosos, de feijão vermelho, tomate, grelhos, a acompanhar o polvo, a petinga, os panados. E claro, o bacalhau à Braga e à Zé do Pipo. Queremos manter-nos o mais tradicional possível e mantermos a essência da comida de panela”.
O nome do restaurante é inspirado no famoso fado Malhoa. Esta letra enfatiza que a obra de Malhoa é uma representação fiel de Lisboa, com a sua vida boêmia e fadista, capturando a essência da cidade e das suas pessoas. Nesse sentido, tal como a pintura e o fado, o restaurante é uma ode à arte, à cultura e à identidade portuguesa, imortalizadas num azulejo pintado à mão no interior do espaço — que conta com 30 lugares.
É precisamente por isso que Carlos sempre teve a vontade de tornar a Adega Malhoa numa casa de fados. “Tendo o mural do fado da Malhoa, e o facto da própria casa ser antiga, em madeira, com o teto baixinho, faz lembrar as típicas casas de fado. Sempre tive a certeza que isto era para ser uma casa tradicional e de fados. Em Braga não existem muitas casas de fado, há uma ou duas que de tempos vão fazendo, e agora nós. Os bracarenses se quisessem ouvir fado ttinham de ir até ao Porto, agora podem ouvir (e comer) a portugalidade no seu melhor durante o jantar”.
O primeiro teste aconteceu no sábado, 8, Dia Internacional da Mulher. O sucesso foi tal que Carlos reuniu na semana passada com a Associação de Fados de Braga, para tornar a noite de fados numa dinâmica constante no restaurante, com a próxima data marcada para 28 de março.
A Adega Malhoa é conhecida por servir várias especialidades do receituário português, como os rojões à moda do Minho ou as costelas medinha de vitela. Contudo, a grande estrela da casa são, segundo o Carlos, as papas de sarrabulho.
“É um prato que vamos tentar manter até maio, pelo menos. Não há um dia que não seja pedido nesta casa”, admite.

Outro prato de excelência é o bacalhau, seja à moda de Braga ou à Zé de Pipo, bem como o estufado de porco preto. No caso do prato peixe, o responsável garante tratar-se de “bacalhau de primeira”. O demolho é feito no espaço à antiga, e as batatas que o acompanham são feitas diariamente no espaço — não há cá opções congeladas para ninguém. Tudo acompanhado por azeite da terra da mãe, São João de Pesqueira, bem como o vinho da casa que chega da mesma região.
O espaço conta ainda com uma alargada seleção de petiscos, como chouriço assado no barro (4,50€), alheira de caça em cama de legumes (6,50€), moelas e rojõezinhos (a partir de 4,50€), bem como prego no pão simples ou com queijo e presunto (a partir de 6€). Quanto aos preços dos pratos, variam consoante a dose. Nas carnes, os preços começam nos 16€ para meia-dose e nos 30€ para uma dose. Nos peixes, vão dos 15€ aos 36€.
Se quiser reservar mesa para jantares de grupo, o espaço disponibiliza de menus com preços entre os 15€ e os 20€, que incluem couvert, entrada, prato principal, bebidas, café e sobremesa.