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Retrato com Alma: a artista de Braga que pinta animais com emoção

Ângela Oliveira deixou o design gráfico para criar uma marca artística que eterniza as memórias afetivas de quem a procura.

Desde que começou a domesticar cães e gatos, o ser humano passou a vê-los não apenas como companhia, mas também como parte da sua identidade e memória. Ao longo da história da arte, estes animais foram frequentemente retratados, dos quadros renascentistas aos retratos burgueses do século XIX. Hoje, numa era marcada pela fotografia e pela velocidade, Ângela Oliveira, 32 anos, decidiu recuperar o carácter íntimo e emocional da pintura. A artista de Braga fundou o projeto Retrato com Alma, onde os animais de estimação são os protagonistas.

Designer gráfica de formação, trabalhou vários anos em empresas de comunicação, onde se dividia entre criação de produtos, gestão de redes sociais e produção de conteúdos. “Esse percurso deu-me uma visão polivalente — desenho, fotografia, vídeo, texto — que hoje aplico naturalmente no meu trabalho”, recorda. No entanto, apesar de o design lhe dar estabilidade, sentia falta de algo essencial: liberdade. “A arte foi desde cedo uma forma de estar e de compreender o mundo, uma forma de o tornar mais bonito e mais sentido. Quando descobri a aguarela, percebi que podia libertar-me da rigidez do realismo e experimentar um material muito mais vivo e imprevisível.”

O amor pelos animais sempre esteve presente. “A minha avó tinha imensos gatos e, no prédio onde vivi quando era miúda, quase todos os vizinhos tinham cães ou gatos”, recorda. Em pequena tinha receio de cães, mas o desejo em adotar uma cadela que mudou tudo. “Acho que, de forma inconsciente, foi a minha maneira de ultrapassar o medo. Ela tornou-se a minha primeira companheira e foi com ela que aprofundei este amor incondicional.” Atualmente é tutora de dois cães resgatados, e é essa sensibilidade que transporta para cada tela. “Não pinto apenas a aparência — tento traduzir a alma e a presença que têm na vida das pessoas.”

A ideia de criar a Retrato com Alma surgiu durante a pandemia. “Nessa altura percebi que precisava de liberdade de tempo e de criação, algo que não encontrava no ambiente empresarial. Mais do que criar retratos bonitos, queria que a arte tivesse impacto emocional.” O passo seguinte foi natural: unir essa vontade ao amor pelos animais. As primeiras encomendas chegaram devagar, através das redes sociais, mas rapidamente percebeu que havia procura. “No início tinha poucos seguidores e quase nenhum cliente, mas a ideia de voltar a um trabalho mais convencional assustava-me mais do que as dificuldades. Hoje sinto orgulho em ver como este projeto se transformou numa marca com identidade própria.”

 
 
 
 
 
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As encomendas seguem sempre o mesmo ritual. Os clientes enviam fotografias e partilham detalhes sobre o animal. A partir daí, Ângela orienta na escolha do formato e do estilo: aguarela, tela em acrílico, silhueta minimalista ou cartoon. “A inspiração está sempre na ligação afetiva entre a pessoa e o animal. Muitas vezes uma única fotografia não é suficiente: preciso de conversar com os donos, perceber a personalidade, as características únicas, uma mancha ou até um pormenor da sua história. São esses detalhes que tornam cada retrato especial.”

Os preços variam entre os 80€ e 600€, dependendo do formato, material e tamanho. As telas em acrílico, em grande formato, são hoje o foco principal, mas continuam a existir versões em aguarela ou silhuetas, mais leves e criativas. Também criou retratos em cartoon, uma forma de chegar a outros públicos e explorar linguagens mais divertidas. “Criar sempre o mesmo aborrece-me. Quis desenvolver retratos leves, que transmitissem também alegria.”

Ao longo do percurso, tem colecionado histórias particularmente marcantes. Antes de lançar a marca, quando o sogro morreu, pintou três aguarelas para oferecer à sogra, ao namorado e à irmã dele. “Aí, percebi que não queria apenas criar retratos realistas, mas obras que tivessem uma carga emocional.” O nome do projeto nasceu dessa experiência: cada pintura teria de ter alma. Hoje, recebe muitos pedidos de pessoas que perderam os seus animais ou familiares, e esses trabalhos continuam a ser os mais emocionantes.

Muitas vezes, as reações são intensas. “Uma cliente habitual encomendou uma pintura, mas os amigos decidiram surpreendê-la e pediram-me uma aguarela dela com o pai. Atravessava um período difícil e ficou muito emocionada quando a recebeu. Momentos como este ficam gravados na minha memória.” Vídeos de lágrimas e sorrisos chegam-lhe de várias partes do mundo, de Espanha ao México, sobretudo em épocas como o Natal. “Há um pedacinho do meu trabalho em casa de cada pessoa.”

O futuro da Retrato com Alma promete novidades. Além das telas dedicadas a animais, Ângela quer orientar workshops para apoiar outros artistas e empreendedores criativos. “Acumulei bastante conhecimento ao longo do caminho, que quero partilhar com outras pessoas.” Ao mesmo tempo, prepara-se para explorar a fotografia, outra paixão que considera ainda mais íntima e inspiradora. “Será uma nova forma de captar emoções e histórias.”

Para já, a sua prioridade continua a ser o essencial: retratar a ligação especial entre pessoas e animais, transformando-a em arte intemporal. Ou, como resume a artista: “Mais do que a técnica ou a semelhança, procuro sempre que a pintura desperte emoção. É isso que dá sentido à Retrato com Alma.”

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